Carta Aberta: Desigualdade entre os Psicólogos Clínicos e da Saúde

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No próximo dia 2 de Dezembro de 2018, completo 15 anos de trabalho hospitalar. Trabalho como CIT, o que significa Contrato Individual de Trabalho, como técnica superior, não me sendo reconhecido o grau de Técnica Superior de Saúde. Situação essa que se mantém também porque o hospital de Faro é EPE. Leiam por favor a carta aberta que se segue, escrita por colegas de Évora na mesma situação, que explica esta reivindicação que também tenho como minha!

Raquel Medeiros

 

CARTA ABERTA

Há psicólogos de 1ª e de 2ª?!?… Desigualdade entre os Psicólogos Clínicos e da Saúde: contrato individual de trabalho vs vínculo de contrato de trabalho em funções públicas

Numa época que se diz privilegiar a Saúde Mental… que tanto se fala em gastos exarcebados com psicofármacos, em baixas médicas, na elevada factura que iremos todos pagar, a longo prazo… Existem cerca de uma centena de Psicólogos Clínicos amplamente diferenciados em várias áreas da Psicologia, em exercício rigoroso da sua profissão, com vínculos em regime de contrato individual de trabalho (CIT) em hospitais EPE que, nos últimos 15 anos, ou mais, se encontram numa posição de injustificada desigualdade de tratamento remuneratório e de carreira comparativamente aos Psicólogos Clínicos com vínculo de contrato de trabalho em funções públicas. Ou seja, os Psicólogos “CIT em hospitais EPE”, detentores das mesmas (ou mais) competências académicas, do mesmo (ou maior) grau de especialização, com as mesmíssimas (ou acrescidas) funções e graus de responsabilidades, tempos de serviço e, surpreendentemente perante (por vezes) o mesmo empregador, apresentam-se alocados a um Regime Geral de Carreira de Técnico Superior – na categoria de estagiários e técnicos de 2ª classe (há anos !!!), auferindo valores brutos oscilatórios de 1101.93 e 1373,12 €uros (tabela Remuneratória antiga) comparativamente aos valores remuneratórios de ingresso de Psicólogos detentores de vínculo de trabalho em funções públicas – contrato de trabalho em funções públicas, com uma remuneração de 1623.21€uros, cujo estatuto legal consta do Decreto-Lei nº 414/91, de 22 de Outubro, na sua redação actual e cuja margem de progressão é francamente alargada. Não obstante, parecem existir alguns colegas em Contrato Individual de Trabalho a serem remunerados como Técnicos Superiores de Saúde, auferindo um vencimento de 1623.21 €uros, mas sem acesso à carreira de Técnico Superior de Saúde e respectiva progressão.

O último grande concurso de admissão ao estágio de especialidade da carreira dos técnicos superiores de saúde – ramo de Psicologia Clínica, foi aberto em 2000! Há 18 anos (Aviso 18121/2000) de 28 de Dezembro!!! O único concurso que obedecia aos princípios de liberdade de candidatura, de igualdade de condições e de igualdade de oportunidades para todos os candidatos!!! Após este, em 2002/3, foi aberto um regime extraordinário de equiparação ao estágio da carreira dos técnicos superiores de saúde, ao qual se candidataram mais de 500 psicólogos (D.L. 38/02 de 26 de Fevereiro)!!!

Em 2010, e após denúncia de precariedade de vínculo laboral dos Psicólogos do Centro Hospital Psiquiátrico de Lisboa, Maternidade Alfredo da Costa e Hospital Curry Cabral (só em Lisboa) e, mais tarde extensível aos Psicólogos de Cuidados de Saúde Primários de todo o país, que viam a sua renovação contratual esgotada devido à alteração do Estatuto do Sistema Nacional de Saúde, disposto no Artigo 40º do Decreto-Lei nº 72-A/2010, de 18 de Junho, instituiu-se um procedimento especial de obtenção do grau de especialista , por equiparação ao estágio da carreira dos técnicos superiores de saúde! Contudo, o mesmo procedimento, defraudava os princípios da liberdade de candidatura, de igualdade de condições e de igualdade de oportunidades para todos os candidatos, uma vez que limitava a candidatura a Psicólogos que exercessem funções em regime de contrato em funções públicas, independentemente da sua modalidade, nos serviços ou organismos integrados no Sistema Nacional de Saúde (SNS)!!! Uma vez mais a exclusão dos Psicólogos com CIT em hospitais EPE!!!

A 14 de Agosto de 2015, no Boletim do Trabalho e Emprego, propriedade do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social (edição do Gabinete de Estratégia e Planeamento), é publicado um “Projeto de diploma para apreciação pública”… “DIPLOMA LEGAL QUE APROVA A CARREIRA DO PSICÓLOGO CLÍNICO, APLICÁVEL AOS TRABALHADORES CONTRATADOS EM REGIME DE CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO, NOS TERMOS DO CÓDIGO DO TRABALHO, NAS ENTIDADES PÚBLICAS EMPRESARIAIS E NAS PARCERIAS EM SAÚDE, EM REGIME DE GESTÃO E FINANCIAMENTO PRIVADOS, INTEGRADOS NO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE, NOS TERMOS DOS DIPLOMAS LEGAIS QUE DEFINEM O REGIME JURÍDICO DOS TRABALHADORES DESSAS ENTIDADES , SEM PREJUÍZO DO DISPOSTO EM INSTRUMENTO DE REGULAMENTAÇÃO COLETIVA DE TRABALHO”. Na página 24 do referido documento podemos ainda ler:

“Em matéria de recursos humanos, os trabalhadores das entidades públicas empresariais do setor da saúde estão sujeitos ao regime do contrato de trabalho, nos termos do Código do Trabalho, bem como ao regime disposto em diplomas que definem o regime legal de carreira das profissões da saúde, demais legislação laboral, normas imperativas sobre títulos profissionais, instrumentos de regulação colectiva de trabalho e regulamentos internos. No âmbito da reformulação do regime de carreiras da Administração Pública desenvolvido ao abrigo da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, criou-se um patamar de referências para as carreiras dos profissionais a exercer em entidades públicas empresariais no âmbito do SNS, pelo que adquire, neste contexto, particular importância a intenção de se replicar o modelo no setor empresarial do Estado. Efetivamente, a padronização e a identidade de critérios de organização e valorização de recursos humanos contribuem para a circularidade do sistema e sustentam o reconhecimento mútuo da qualificação, independentemente do local de trabalho e da natureza jurídica da relação de emprego. Para alcançar este desiderato, torna-se imperativo alterar, em conformidade, o regime de pessoal das entidades públicas empresariais no domínio do SNS para todos os profissionais de saúde. Cumpre, a este propósito, referir que a presente alteração não condiciona a aplicação do Código do Trabalho nem a liberdade de negociação reconhecida às partes no âmbito da negociação colectiva. Em síntese, através do presente decreto-lei, o governo pretende que os psicólogos clínicos das instituições de saúde no âmbito do SNS possam dispor de um processo comum de progressão profissional e de diferenciação técnico-científica, o que possibilita também a mobilidade interinstitucional, com harmonização de direitos e deveres, sem subverter a autonomia de gestão do sector empresarial do Estado. Nesta conformidade, o presente decreto-lei vem agora instituir uma carreira do psicólogo clínico nas entidades públicas empresariais e nas parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados, integrados no SNS, bem como os respectivos requisitos de habilitação profissional e percurso de progressão profissional e de diferenciação técnico-científica”.

Uma esperança renascida… Mas mais uma vez, nada mudou!

A 26 de Abril de 2018, enviámos uma carta à Sua Excelência, a Senhora Secretária de Estado da Saúde, Dra. Rosa Matos, intitulada “Desigualdade dos Psicólogos nos Hospitais EPE”. Após um longo silêncio, recebemos (6 meses após – 9 Outubro de 2018) resposta descontextualizada, tanto na sua forma como no seu conteúdo, por parte da Administração Central do Sistema de Saúde, IP, firmada pelo vogal executivo Dr. Pedro Alexandre, onde se pode ler:

“(…) as apontadas discrepâncias que importará corrigir resultam, em parte, do facto da carreira do técnico superior de saúde que integra, como um dos seus ramos profissionais a Psicologia Clínica, não se encontrar completamente revista do ponto de vista da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro e do ponto de vista dos profissionais de saúde nas unidades hospitalares do Serviço Nacional de Saúde integrados no setor público empresarial (E.P.E.). No mesmo sentido, assinala-se também o lapso temporal que vem decorrendo desde o último processo concursal para admissão a estágio com vista à atribuição do grau de especialista, o qual, como é conhecido, se assume como condição de acesso àquela carreira de técnico superior de saúde, em qualquer dos seus ramos profissionais. Acrescem aos constrangimentos descritos, as restrições orçamentais à contratação de novos trabalhadores que, desde 2011 e com especial incidência sobre o período de Assistência Económico-Financeira a que Portugal esteve sujeito, têm vigorado, nomeadamente no sector da Saúde e que, de alguma forma, terão contribuído para o protelamento da abertura daquele procedimento concursal. Não obstando o que antecede, mais se informa que se encontra no momento presente a decorrer, ainda em fase de apresentação de candidaturas que se prolongará até ao dia 9 de Outubro, o procedimento concursal para a admissão a estágio com vista à atribuição do grau de especialista no ramo de Psicologia Clínica no âmbito dos cuidados de saúde primários, aberto pelo Aviso nº 12314-A/2018 (…)”.

Na realidade a 27 de Agosto de 2018, foi aberto procedimento concursal para admissão a estágio com vista à obtenção do grau de especialista no ramo de Psicologia Clínica da carreira dos técnicos superiores de saúde. Congratularam-se de imediato os psicólogos com “CIT em hospitais EPE” por este êxito alcançado.

Contudo, e uma vez mais, um concurso amplamente redutor, impregnado de subtilezas, de critérios de avaliação curricular e profissional balizados aos cuidados de saúde primários, subvalorizando os que sempre se dedicaram aos cuidados hospitalares. Pergunta-se de imediato, que acontecerá se, os Psicólogos com CIT, com 15 ou mais anos de trabalho efectivo se candidatem e forem aprovados ao referido estágio?! Decerto que ocuparão uma “vaga das 40 abertas”, desocupando outra em instituições do SNS que já, por si mesmas, funcionam nos limites mínimos!!! E depois (?!) o que acontece aos lugares desocupados?! Uma manta curta que, para tapar os pés se destapa o peito!!! Mais se ressalva, o descrédito da tão apregoada valorização profissional e académica, que traça como caminho único, pelo menos até ao presente, a exigência de cumprimento de um estágio, a quem já trabalha e assume responsabilidades profissionais de valor acrescido há anos e se terá que sujeitar potencialmente a ser supervisionado por colegas que foram em tempos seus estagiários!!! Um contrassenso entendível por todos!!! Mais um claro enviesamento do SNS!

Estamos sós, a lutar por uma causa de defesa da dignidade profissional, por uma situação insustentável, que viola frontalmente o nosso direito ao trabalho, com assento Constitucional no art 58.º da Constituição muito particularmente, o direito “à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna”, plasmado no art 59.º da Constituição da República. Perante este cenário, considera-se que a situação em que vivemos, alguns de nós, repete-se há mais de 15 anos, viola os nossos direitos enquanto trabalhadores.

Estamos sós, quando confrontados com um “silêncio ensurdecedor” por parte de uma Ordem profissional, que não dá resposta quando inquirida e promove paralelamente a atribuição de títulos de especialista, cujo valor acrescido e prático dentro de uma carreira no SNS é NULO!!! Vaidades expositivas, que ficam sempre bem numa parede de consultório (para alguns)!!!

Termina-se questionando, será tão onerosa para o erário público a abertura de um novo procedimento especial de obtenção do grau de especialista, por equiparação ao estágio da carreira de técnicos superiores de saúde, tal como o aberto em 2002/3, que abranja os Psicólogos com contratos individuais de Trabalho em Hospitais EPE?!? Há psicólogos de 1ª e de 2ª?!? Há vontade de manter o SNS vivo e de boa saúde?

Portugal, 25 de Novembro de 2018

P’ grupo crescente de Psicólogos com Contrato Individual de Trabalho em Hospitais EPE

Psicóloga clínica no Centro Hospitalar Universitario do Algarve, CHUA desde 2 de Dezembro de 2003 Especializações: - Terapeuta…

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